INTRODUÇÃO


Joaquim Pires está localizado a 229 quilômetros da capital Teresina e a 110 quilômetros do litoral piauiense, possui uma superfície de 739,570 Km2 (VIEIRA, 2003). A zona eleitoral a qual faz parte é a 85ª zona, e possui aproximadamente 7.853 eleitores, numa população de cerca de 13.169 habitantes, onde praticamente 70% dessa população reside na zona rural e predomina o sexo masculino.
Objetiva-se através desta pesquisa levar o leitor a uma reflexão acerca das ações dos grupos que têm governado esta cidade, que indubitavelmente usam suas retóricas para envolver os eleitores dentro do que parece ser um jogo de interesses pelo poder, que é a política de Joaquim Pires.
A história sempre andou lado a lado com o poder. É difícil escrever história sem que o poder esteja ali presente. Francisco Falcon (1997, p.61), diz que história e poder “são como irmãos siameses – separá-los é difícil; olhar para um sem perceber a presença do outro é quase impossível”.
Entende-se aqui como história, os registros dos acontecimentos. Como poder entende-se domínio, força, como também, autoridade constituída.
A concepção de história tem seu berço na Grécia, onde trazia uma narrativa de ações heróicas ou humanas e, futuramente passaria a chamar-se história política tradicional que, ligada ao poder pretendia ser também memória (FALCON, 1997, p.62, 63).
Segundo LE GOFF (1996, p.423),

A memória, como propriedade de conservar certas informações, remete-nos em primeiro lugar a um conjunto de funções psíquicas, graças as quais o homem pode atualizar impressões ou informações passadas, ou que ele representa como passadas.

Pode-se observar entre os joaquimpirenses, que grande parte deles demonstram pouco interesse em relação ao passado histórico da cidade, e durante esta produção científica nos deparamos com determinadas situações em que pessoas que testemunharam fatos importantes da política local, se omitiram a compartilhar informações, contribuindo dessa forma com a amnésia coletiva da população da cidade. Num ponto de vista metafórico, a amnésia vem a ser não só uma perturbação do indivíduo, mas também a falta ou perda voluntária ou involuntária da memória coletiva nos povos e nações que pode determinar perturbações graves da identidade coletiva, causando consequentemente o perecimento da memória, até então desvalorizada pela população de Joaquim Pires.
Queremos assim chamar a atenção da importância de buscar o passado, relembrar fatos, buscar conhecimento das origens, sejam nas fontes escritas ou orais, tudo isso para que se possa modificar o presente, e essa modificação do presente é ao meu ver um dos principais motivos de se manter viva a memória, e isso é história.
Márcia Mansor D’Aléssio (2001, p.60), reflete:

Os estudiosos da memória são praticamente unânimes em afirmar que o atual prestígio da memória se deve à aceleração do tempo na contemporaneidade e ao medo do desaparecimento das lembranças. Povos desprovidos de lembranças correm o risco de não saberem quem são.

Não se pode fazer história, sem que se ouça as testemunhas e se faça uso da memória. Atualmente, a maioria dos autores concorda que quando trabalhamos a memória, estamos tratando de construir referenciais sobre o passado, daí a ligação fortíssima entre memória e história.
Falando a respeito de memória, Franco (2004, p.09), escreve que:

Nossas raízes é que nos prendem à vida, dão-nos sustentação, irrigam nossos comportamentos e ações, que são nossos frutos. Como as plantas, que se prendem a terra pelas raízes, assim o somos, ou seja, presos à vida pelas nossas raízes, que são adubadas pelas ricas lembranças que a memória possibilita, sem memória, seríamos como plantas desenraizadas, portanto soltas e à mercê das intempéries do tempo.

A metodologia aplicada neste trabalho é norteado através do recurso da oralidade como fonte, onde vale a pena ressaltar que tal metodologia são referendadas por autores como Paul Thompson (1998), Ecléa Bosi (1994), Antônio Torres Montenegro (1992), que fazem da técnica oral um recurso essencial no desenvolvimento da narrativa dos fatos.
Segundo Bosi (1995, p.88,89,90):

A narração é uma forma artesanal de comunicação [...] O passado revela desse modo não é o antecedente do presente, é sua fonte [...] A história deve reproduzir-se de geração em geração.

O historiador grego Heródoto (Séc. V a.C.) já dizia: "Desejoso de saber, interrogo". Dessa forma nota-se que não é de agora que as fontes orais são utilizadas para o desenvolvimento de um trabalho de pesquisa, como metodologia para se escrever História.
Para THOMPSON (1998, P.25):

A fronteira do mundo acadêmico já não são mais os volumes tão manuseados do velho catálogo bibliográfico. Os historiadores orais podem pensar agora como se eles próprios fosse editores: imaginar qual a evidência de que precisam, ir procurá-la e obtê-la.

A oralidade pode alterar tanto o conteúdo quanto a finalidade da história, além de poder mostrar ao historiador novos campos de investigação. Ela não faz distinção de classe, religião, cor ou raça. Ela não pode ser parcial. As testemunhas das “classes dos derrotados” agora podem fazer parte da história.
A metodologia da oralidade, nos pode dar uma oportunidade de reconstruir os fatos de forma imparcial e realista.
Paul Thompson (p.44), ainda comenta que:

Ela lança a vida para dentro da própria história, e isso alarga seu campo de ação. Admite heróis vindos não só dentre os líderes, mas dentre a maioria desconhecida do povo (...) Em suma, contribui para formar seres mais completos (...) e oferece os meios para uma transformação radical do sentido social da história.

Procuraremos embutir esses conceitos no desenvolvimento de tal pesquisa, que também usaremos como fonte matérias de revistas, livros didáticos, registros públicos, artigos que se encontram na Internet e, equipararemos a leitura didática com os fatos e informações adquiridas através de entrevistas com atores que testemunharam o cotidiano político de Joaquim Pires nas décadas de 60 e 70.
Jeanne Marie Gagnebin (2001, P.15), diz que:

Testemunha não seria somente aquele que viu com seus próprios olhos, o "histor" de Heródoto, o testemunha direto. Testemunha também seria aquele que não vai embora, que consegue ouvir a narração insuportável do outro e que aceita que suas palavras revezam a história do outro: não por culpabilidade ou por compaixão, mas porque somente a transmissão simbólica, assumida apesar e por causa do sofrimento indizível, somente esta retomada reflexiva do passado pode nos ajudar a não repeti-lo infinitamente, mas a ousar esboçar uma outra história, a inventar o presente.

O contato com estes atores foi feito de uma forma muito simples, lembrando que tivemos alguns encontros dias antes da gravação de seus depoimentos, o que os deixou muito à vontade na hora da entrevista, as quais traz alguns termos e expressões típicas do “homem do interior”, com uma linguagem que aparece com um tom coloquial, mas que deixa transparecer a emoção daquele entrevistado (a), de estar voltando ao passado e sentindo como se estivesse vivendo aquilo novamente. Isso nos faz refletir ainda mais sobre a importância e a riqueza que tem a oralidade, que transforma em “gênios” do passado e do presente, o entrevistado e o entrevistador, respectivamente.
Márcia Mansor D’Aléssio (2001, p.69), comentando a respeito da exposição oral e a participação do entrevistador, fala que:

A exposição oral de um tema retira o autor do isolamento da escrita. A presença do interlocutor passa a fazer parte da composição do texto. Ainda que em silêncio, o outro é uma escuta. Finalmente, é importante perceber o papel do entrevistador; este coadjuvante do processo de produção do saber durante uma entrevista não quer ler um texto, quer ouvir, não quer a letra, quer a fala.

A cidade de Joaquim Pires tem sido para nós um laboratório aberto, nos propiciando um melhor entendimento a esse respeito, o que veio a despertar em nós, o interesse por sabermos de que forma surgiram esses grupos que num espírito de rivalidade, lutam entre si em busca do poder do município.
É em meio essa questão, que desenvolvemos o estudo da formação de grupos políticos a partir da história de três latifundiários joaquimpirenses, que em suas contemporaneidades, dois deles recebiam o título de coronel.
Usaremos como recorte do tempo as décadas de 1960 e 1970. A década de 60, por que foi o marco inicial das disputas eleitorais a nível municipal com a formação de um segundo grupo político-partidário (visto que existia apenas um antes da emancipação), e a década de 70, por que foi nesta década que ocorreu o surgimento de um terceiro grupo, que ainda hoje permanece no poder na cidade. Foi nesse recorte que tiveram destaque na liderança política do município, Agripino Costa, Francisco Leôncio e Antônio Miroca, os latifundiários acima citados, que foram os precursores das oligarquias joaquimpirenses.
E assim faremos, recorrendo à análise de trabalhos e opiniões de autores que já escreveram sobre as ações de oligarquias em contextos gerais, como Antônio José Medeiros (1996) e Victor Nunes Leal (1997), e faremos um entrelaçado entre a teoria vista nos livros didáticos e a prática já vista na cidade de objeto de estudo.
Com o espírito curioso de pesquisador, faremos um levantamento das seguintes questões:
1º - Que interesses essas pessoas tinham para adquirir o poder?;
2º - Qual a personalidade desses homens que lideravam esses grupos?;
3º - Que tipo de relações existia entre o coronel e o povo?;
4º - De que forma esses homens eram vistos pelos olhos populares?;
5º - Que estratégias usaram para chegar ao poder político?;
6º - Como permaneceram por tanto tempo no poder?;
7º - O que aconteceu para alguns deles perderem o poder?;
É dessa forma que buscaremos mostrar como se deu o processo de formação dos grupos oligárquicos de Joaquim Pires.
No primeiro capítulo, refletiremos sobre as origens oligárquicas na cidade de Joaquim Pires através da prática do mandonismo local. A importância que teve o fato de ser proprietário de terra na hora de influenciar a ocupação do cargo de chefe político da cidade. A existência do coronel na política joaquimpirenses foi marcante nas raízes da tradição política local. Falaremos sobre o convívio que existiam entre os coronéis e moradores de suas terras em relação ao voto de cabresto.
No segundo capítulo, revisitaremos as épocas da origem e emancipação da cidade de Joaquim Pires, contando com a ajuda de registros públicos, e a fala daqueles que viveram a época. Daremos destaque sobre a forma que ocorreu a emancipação da cidade, as circunstâncias que a levaram a acontecer, onde só foi consumada depois de ter sido feito um acordo político do PSD e da UDN, partidos de grande influência na época. Na fala de que esteve lá, saberemos como foi aquele dia. Analisaremos os motivos que levaram a cidade a chamar-se Joaquim Pires, o qual foi um senador piauiense que fazia parte da família Pires Ferreira. Comentário sobre a trajetória política na cidade de Joaquim Pires por parte de membros desta família, uma das maiores quando se fala em oligarquia na região norte do Piauí.
No terceiro capítulo, falaremos especificamente sobre os “Coronéis” da política de Joaquim Pires, sendo eles: Agripino Costa, Francisco Leôncio e Antônio Miroca, os quais afirmamos serem eles os precursores na formação das oligarquias joaquimpirenses. Buscamos os vários aspectos de suas vidas, principalmente o político, o social e o econômico. Amados por alguns e odiados por outros, é através desse capítulo que entenderemos de como esses atores entraram na política e influenciaram na formação das oligarquias na cidade.
No quarto capítulo, faremos um reflexão sobre quais as ações que caracterizaria as oligarquias joaquimpirense. Falaremos de sucessão no executivo e veremos quais membros das  famílias oligárquicas ocuparam ou ocupam cadeiras no legislativo municipal. Faremos análises da conivência dos vereadores com as ilicitudes do gestor público, assim como esmiuçaremos as fraudes eleitorais, e isso tudo pra mostrar as artimanhas que as oligarquias joaquimpirenses fazem uso para manter-se no poder. Refletiremos acerca da Perseguição aos adversários políticos e o “Fechamento” do subsistema político na cidade. E como não poderíamos deixar de citar, falaremos também sobre o uso do clientelismo, compra de votos e o uso da “máquina pública” como cabide de emprego alimentando dessa forma a rede clientelista que parasita a administração pública municipal.
No quinto capítulos, faremos uso da narrativa resgatando a memória dos nossos entrevistados que, através das entrevistados revisitam o passado e relatam suas reminiscências. Refletindo sobre quais critérios deveríamos adotar no ato da escolha dos entrevistados, achamos por bem buscar aqueles que lidaram diretamente com os oligarquas joaquimpirenses,  sendo eles próprio, parentes próximos, políticos da época e/ou populares que participavam do dia-a-dia político destes homens.